domingo, 27 de fevereiro de 2011

De uma experiência

No sábado tive a oportunidade enriquecedora de assistir à televisão em "horário nobre" por uns 40 minutos. O grau de reflexão sempre chega ao ápice quando me encontro imersa nesse tipo de circunstância ausente de alternativa. O que resta, enfim, é estabelecer algumas conexões mentais para não paralisar o cérebro.
Não consigo compreender o motivo pelo qual um estabelecimento que se propõe a oferecer comida, bebida e momentos agradáveis e supostamente de lazer para seus clientes pode investir - junto a quatro paredes permeadas de amplas e arejadas janelas e fotos que nos trazem lembrança de celebridades da música e do cinema (como Renato Russo, Cazuza, Elis Regina, Carmem Miranda, Frank Sinatra, Os Beatles, Marilyn Monroe, James Dean) dentre outros que poderiam nos instigar a bons assuntos - em nada menos que duas TVs LCD de 22 polegadas ofuscando toda a decoração.
Casais sentam-se lado a lado, de mãos unidas, olhando para o mesmo foco: a TV. Dizem que é isso que traz longevidade ao relacionamento... Famílias reunidas para o jantar ao som da "novela das oito", ou ainda de notícias sobre fuga da Líbia ou sobre ciclistas deliberadamente atropelados. Dá pra imaginar como a digestão ocorre sob esse tipo de informação... Ainda bem que existem crianças que ainda brincam. Deve ser porque o horário não é de desenho animado.
Mas o que continua me assustando de maneira alucinada é a capacidade que a TV tem de mostrar fatos desse calibre e logo após apresentar um cara simpático, alegre e feliz falando sobre as estripulias e velocidades que um determinado automóvel consegue realizar. É deprimente! É o grau máximo da construção e expansão cada vez mais consistente da insensibilidade humana. E ainda tem a cara de pau de concluir o programa fazendo uma apologia ao documentário "Lixo Extraordinário" como indicado ao Oscar quando as pessoas se vestem para participar do evento trajando tecidos finos e pedrarias que certamente extrapolam os limites do bom senso.
Uma ressalva faço com relação às propagandas! Extremamente criativas e divertidas! Servem para várias coisas desde que não se associe a beleza do comercial àquilo que comercializa: não sei se pessoas alegres, bronzeadas, bonitas, jovens e magras flutuando e rindo em paz em um céu límpido e claro podem ser facilmente associadas à Coca-Cola. Lamento pelos obesos que certamente não se identificam com essa fluidez e pedem uma Coca Zero pra evitar a frustração de não corresponderem ao esperado pela mídia.
Minto! Lamento por mim, que sinto minha inteligência subestimada ao perceber que até o pacotinho de Catchup fornecido pelo local parece rir da minha cara. Como se explica o corte do produto se apresentar do lado direito e a indicação de onde rasgar aparecer escrita do lado esquerdo? Para alguém que abre o pacote com os dentes enquanto mantém os olhos fixos na TV não deve ser problema algum.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

De um achado


Com as pernas cruzadas sob a mesa, os cotovelos apoiados, a cabeça em uma das mãos e o lápis na outra, ela se esforça para escrever a primeira linha. As palavras logo fogem deixando a frase inconclusa e o olhar desviado pelo pensamento alheio que lhe invade a mente. Esta, a princípio sóbria, se embebeda do que lhe preenche como vinho no sangue ausente de alimento.


Desiste. Levanta e toma um café. Enquanto o líquido escuro, quente e perfumado toma seu lugar no espaço vazio, branco e frio que lhe destina, ele, do outro lado da cidade, decide: "Ah! Vou tomar um café!".